Dados registrados pelos serviços de saúde do Rio Grande do Sul, abrangendo hospitais, postos e clínicas da rede pública e privada, indicam que uma pessoa morre a cada 26 horas no Estado, vítima de acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais. O levantamento foi apresentado à imprensa nesta quinta-feira (27), na sede do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), em Porto Alegre. O evento foi uma iniciativa do Programa Trabalho Seguro, desenvolvido pela Justiça do Trabalho em parceria com o Ministério Público do Trabalho, o Ministério do Trabalho e diversas instituições parceiras. A divulgação ocorreu na véspera do Dia Mundial em Memória às Vítimas de Acidentes do Trabalho, celebrado nesta sexta-feira, 28 abril.
As informações são do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS), vinculado à Secretaria Estadual da Saúde e parceiro do Programa Trabalho Seguro. O órgão extrai dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações em Saúde do Trabalhador (SIST).
Em 2016, os estabelecimentos notificaram 44.145 atendimentos relacionados ao trabalho, sendo 95% casos de acidentes e 5% de doenças laborais. Do total de ocorrências, 331 resultaram em morte da vítima, chegando-se à média de um óbito a cada 26 horas. O quadro se agravou em relação a 2015 e 2014, quando foram notificadas 309 e 293 mortes, respectivamente. O número pode ser maior: conforme o CEVS, ainda há situações em que os profissionais de saúde atendem as vítimas e acabam não registrando a notificação que aponta o trabalho como causa.
Entre as vítimas de acidentes, 67% foram homens e 33%, mulheres. Já os pacientes acometidos por doenças do trabalho foram 57% do sexo feminino e 43%, do masculino. Cerca de 57% dos registros envolveram pessoas de 20 a 39 anos de idade.
De acordo com o relatório, os casos aconteceram principalmente nas zonas urbanas (78%). Outros 13% ocorreram em áreas rurais e em 8% das notificações a região não foi informada. Os setores com maior número de ocorrências são, na ordem: metal-mecânico, agropecuária, saúde, construção civil, comércio, alimentação e serviços.
Conforme o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul, Rogério Uzun Fleischmann, os dados disponíveis são trágicos, tanto que está sendo planejada a criação de um Comitê de Óbitos, regional, para consolidar essas estatísticas, a partir da cooperação entre órgãos envolvidos na proteção da saúde e da segurança do trabalhador. "O objetivo é conhecer melhor o problema para aumentar a qualidade da prevenção, buscando-se informações específicas sobre áreas e funções nas quais mais ocorrem mortes decorrentes de acidentes de trabalho", explicou.
Número mais alarmante que o da Previdência Social
O levantamento mais utilizado no país para se analisar a questão dos acidentes e doenças do trabalho é o Anuário Estatístico da Previdência Social. Porém, o estudo não reflete toda a realidade, pois considera apenas casos ocorridos com empregados de carteira assinada, que, conforme o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), representam cerca de 55% dos trabalhadores ativos.
A última edição do relatório foi divulgada em dezembro de 2016, com dados relativos a 2015. Conforme o estudo, o Rio Grande do Sul segue na terceira posição do ranking nacional de acidentes e doenças de trabalho, com 52.030 casos (97% acidentes e 3% doenças), atrás apenas de São Paulo (207.703) e Minas Gerais (62.566). O número é 13,3% menor que o de 2014, ano que teve 60.020 casos registrados. O anuário também indica diminuição no número de mortes no Estado (de 160 para 146) e de trabalhadores que se tornaram incapacitados permanentemente (de 1.098 para 834).
Em todo o Brasil, o levantamento da Previdência Social indicou a ocorrência de 612.632 casos em 2015 (97% acidentes e 3% doenças), uma diminuição de 14% em relação ao ano anterior, além de 2.502 mortes (-11,24%) e 11.018 novas situações de incapacidade permanente (-31%). Segundo a Organização Internacional do Trabalho, o Brasil é o quarto país com o maior número de acidentes de trabalho, atrás apenas de China, Índia e Indonésia.
Porém, a redução das estatísticas não significa que a prevenção tenha aumentado na mesma proporção, garantiu o auditor-fiscal do Trabalho Luiz Alfredo Scienza. Segundo ele, são diversos os fatores podem ter corroborado com essa diminuição. Um deles é a retração da economia ocorrida em 2015, quando houve corte de 1,5 milhão de empregos com carteira assinada no Brasil. Um dos setores mais afetados, a indústria, que concentra elevado número de acidentes, reduziu em 7,41% o número de postos de trabalho, por exemplo. "Além disso, em um cenário de crise as pessoas têm uma dificuldade maior de demonstrar seu adoecimento, pelo medo de perder o emprego", acrescentou o auditor. Scienza avaliou que a greve dos peritos do INSS realizada entre setembro de 2015 e janeiro de 2016 também pode ter afetado o registro de casos nesta edição do anuário.
O gestor do Programa Trabalho Seguro no TRT-RS, desembargador Raul Zoratto Sanvicente, comentou o impacto dos acidentes e doenças laborais na Justiça Trabalhista e na Previdência Social. Em 2016, as Varas do Trabalho do Estado receberam 10.155 ações relacionadas ao tema (mesmo patamar de 2015). Os processos envolvem, basicamente, pedidos de indenizações por danos morais e materiais. Devido à especificidade da matéria, duas cidades gaúchas contam com Varas especializadas em acidentes de trabalho: Porto Alegre e Caxias do Sul. Segundo Sanvicente, grande parte da demanda envolve terceirização, ramo em que se observa maior precariedade na segurança do trabalhador.
O desembargador explicou que além da dor e do sofrimento das famílias, a falta de segurança no trabalho também gera custos para todos os lados. Só a Previdência Social desembolsou, em 2015, cerca de R$ 10,2 bilhões em benefícios às vítimas de acidentes e doenças do trabalho. Ainda há a sobrecarga nos sistemas de saúde, que também deve ser considerada. "O custo é muito alto. Para as famílias, que acabam gastando com tratamentos, para as empresas, que pagam indenizações às vítimas e ainda podem sofrer ação regressiva do INSS, e para a sociedade em geral", afirma o magistrado. "O investimento em prevenção deve ser priorizado. A empresa precisa mapear seus processos de trabalho e estabelecer planos preventivos para cada um deles, além de fornecer corretamente os equipamentos de segurança e treinamento. Já os empregados devem usar corretamente os equipamentos e seguir as normas de segurança da empresa", comentou Sanvicente.
Acesse aqui os slides da apresentação.
Fonte: Gabriel Borges Fortes (Secom/TRT4)
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