8 de abr. de 2015

Primeiro encontro do Projeto Democratizando na Câmara de Vereadores de Flores da Cunha

Dia 1º de abril, na Câmara de Vereadores de Flores da Cunha iniciou a apresentação dos trabalhos da 9ª Mostra de Cinema e Direitos Humanos do Hemisfério Sul através do Projeto Democratizando. 

A ação tem por objetivo suscitar o debate sobre os direitos humanos em âmbito nacional.

No primeiro encontro foi trabalhado com os filmes "Sophia", de Kenner Rógis e "Vizinhança do Tigre", de Affonso Uchoa. O trabalho foi coordenado pela psicóloga Rochele Sachet Antoniazzi, com foco na sensibilização dos direitos humanos. 

A mostra propicia uma leitura atual da maneira como os Direitos Humanos são compreendidos e retratados em países do Hemisfério Sul. 

O projeto é uma ação da Comissão de Educação Saúde, Agricultura, Serviços Públicos e Direitos Humanos da Câmara de Vereadores em parceria com o Centro de Estudo, Pesquisa e Direitos Humanos (CEPDH), de Caxias do Sul.










"o sonho da mídia livre"

8/abr/2015, 7h10min

Fórum Social Mundial de Túnis 2015: o sonho da mídia livre (por Jacques Távora Alfonsin)

Entre os muitos inconvenientes da concentração privada dos meios de comunicação no Brasil, o maior deles, talvez, é o de as empresas com direito ao exercício de uma função dessa relevância, com poder decisivo de formar ou deformar opiniões e ideas de todo um povo, confundirem concessão pública e liberdade de expressão com licença para publicar o que bem entendem.

Uma simples comparação de disposições da nossa Constituição Federal, no capítulo por ela reservado à comunicação social (artigos 220 a 224), com a realidade vivida agora no país, é grande a distância entre a sua pretensão de fazer valer o direito do povo ser bem informado com as versões correntes na mídia sobre essa realidade. As/os nossas/os leitoras/es podem fazer um juízo crítico  sobre isso, lendo algumas daquelas disposições.

Sobre o poder privado de manipulação da notícia, por exemplo, o  art. 220, parágrafo 5º da Constituição determina:

"Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

Qual a chance de um comando como esse alcançar efeito prático, sabendo-se que grande parte de agentes políticos brasileiros, com poder para decidir, a respeito, é titular de direito de explorar rádio e TV, revista e  jornal? quando um determinado patrocinador de publicidade paga a um meio de comunicação social incorre em um determinado ilícito civil ou penal, esse meio não se sente em nada tolhido para divulgar o fato?  Mas afinal, a liberdade de expressão, prevista também no inciso IX do art. 5º da Constituição, faculta até não divulgar fato que o povo tem direito de conhecer?

Sobre o conteúdo das programações de rádio e TV determina o art. 221 da mesma nossa Constituição:

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Lendo só o inciso IV deste artigo, alguém consegue identificar algum dos seus efeitos em programas de TV como o do BBB da Rede Globo, ou o do Ratinho no SBT?

Mesmo que nenhum tipo de divulgação de notícia possa ser garantido antecipadamente como imune a abuso, o Fórum Social de Túnis deste ano procurou mostrar os prejuízos que a sociedade sofre quando a comunicação social é distorcida, manipulada ou mentirosa, justamente quando nenhuma possibilidade de controle independente e responsável é exercido sobre ela.

Segundo informa Ana Cristina Campos, da Agência Brasil, em nota disponível na internet, o  Forum assinou, no dia 28 de março passado, uma "Carta mundial da mídia livre, com princípios e ações estratégicas para promover uma comunicação democrática em todo mundo."

"Entre as prioridades estabelecidas no documento estão o desenvolvimento de marcos democráticos de regulação da comunicação, por meio de órgãos independentes, o apoio aos meios de comunicação comunitários e a independência da mídia pública em relação ao governo e ao mercado." (…) "A carta também defende a governança democrática da internet, incluindo a garantia de neutralidade da rede, o direito à vida privada e à liberdade de expressão, além da universalização do acesso aos meios de comunicação e à internet banda larga."

"Uma comunicação democrática em todo o mundo", "o desenvolvimento de marcos democráticos de regulação da comunicação por meio de órgãos independentes" (…) "em relação ao governo e ao mercado" "a governança democrática da internet", "o apoio aos meios de comunicação comunitários", são elementos indispensáveis, salvo melhor juízo,  de garantia da responsabilidade inerente à liberdade de expressão sem a qual essa  vai continuar confundindo tudo isso com censura, como grande parte da mídia do país tenta convencer o seu (!?) público.

Comprovação desse fato aparece em estudo extraordinariamente lúcido e abrangente da mídia ("Mídia e democracia" de Pedrinho Guareschi e Osvaldo Biz, Porto Alegre: Evangraf Ltda. 2005), mostrando como a falta de qualquer limite à liberdade de expressão transforma a mídia numa ditadura deseducadora. Lembrando Ignacio Ramonet sobre os telejornais, por exemplo, reconhecidamente um dos veículos mais acessados pelo povo, pode-se ler aí o seguinte:

"… o telejornal em seu fascínio pelo espetáculo do evento, desconceitualizou a informação, imergindo-a novamente, pouco a pouco, no lodaçal do patético. Insidiosamente, estabeleceu uma espécie de nova equação informacional que pode ser formulada desta maneira: "Se a emoção que vocês sentem ao ver o telejornal é verdadeira, a informação é verdadeira."

Os autores acrescentam:

"No capitalismo, no negócio da mídia, o nó central é a imagem. Tudo passa por ela. Trata-se da fabricação da imagem da mercadoria e não da mercadoria. Por isso, os conglomerados da mídia são obstáculos para o cidadão ter a informação. O que interessa é o entretenimento, a aquisição dos produtos fabricados pelos donos do  capital. A lógica é vender/comprar o olhar do leitor ou telespectador, não é informar."  

Comunicar, portanto, como a própria palavra indica, é tornar comum uma determinada verdade. Presa de interesses como os denunciados pelo Fórum Social Mundial de 2015, em Túnis, e por críticos como Guareschi e Biz, sendo vítima conhecida de um oligopólio de fato e inconstitucional, como é o da maioria da nossa mídia mais influente e poderosa, a verdade tem pouca ou nenhuma chance de ser revelada.

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Jacques Távora Alfonsin é Procurador do Estado aposentado, Mestre em Direito pela Unisinos, advogado e assessor jurídico de movimentos populares.


http://www.sul21.com.br/jornal/forum-social-mundial-de-tunis-2015-o-sonho-da-midia-livre-por-jacques-tavora-alfonsin/

7 de abr. de 2015

Não ao PL 4330 da terceirização

Dossiê: Não ao PL 4330 da terceirização


dias 7, 15 e 22 :: em Flores da Cunha

9ª Mostra de Cinema e Direitos Humanos do Hemisfério Sul,

através do Projeto Democratizando, 

na Câmara de Vereadores de Flores da Cunha:

dia 7, 19h :: PELAS JANELAS e RIO CIGANO
dia 15, 19h :: CABRA MARCADO PRA MORRER
dia 22, 19h :: QUE BOM TE VER VIVA

A ação tem por objetivo suscitar o debate sobre os direitos humanos em âmbito nacional. O trabalho, que será coordenado pela psicóloga Rochele Sachet Antoniazzi (CEPDH), apresentará algumas amostras cinematográficas com o foco na sensibilização dos direitos humanos.

O projeto é uma ação da Comissão de Educação Saúde, Agricultura, Serviços Públicos e Direitos Humanos da Câmara de Vereadores e do Centro de Estudos, Pesquisa e Direitos Humanos (CEPDH), de Caxias do Sul.


2 de abr. de 2015

O Mistério Pascal hoje...

O Mistério Pascal hoje...


Pedrinho Guareschi


"Popule meus, quid feci tibi? In quo contristavi te? Responde mihi!" | "Povo meu, que é que lhe fiz? Em que o contristei? Responda-me!"

Que me perdoem os amigos(as) se os surpreender com essas minhas meditações, mas algo me força a partilhá-las, que força interna será essa? Arrisco, com humildade, essas reflexões, pedindo já desculpas... Os cristãos comemoram o Mistério Pascal, o mistério que nunca compreenderemos, da íntima ligação em nossas vidas entre morte e ressurreição. Quem compreenderá? Mas o que me leva a essa partilha é que vejo hoje, tão nitidamente (para mim...) como esse mistério se concretiza... É o Servo de Javé ferido, machucado, sangrado, crucificado... e um povo que o aclamou há pouco, gritando: crucifica-o! Mas o que queria dizer é: vivi ao menos 50 anos de minha vida ligado ao povo, aos pobres, nas vilas, periferias...E vi as lutas, dores, mortes e também ressureições! E agora, nesse ano de 2015, vivo e sofro novamente esse mistério, mas de um modo que talvez espante a alguns. Celebro, na memória da Paixão de Jesus, sua flagelação, sua execração. E leio nas celebrações as leituras da liturgia, as lamentações do Profeta Jeremias prefigurando essa Paixão de Jesus, em que o Servo diz: "Povo meu, que é que te fiz, em que te contristei? Porque me flagelas? Porque te tirei da escravidão do Egito? Porque te alimentei no deserto? Por que te conduzi a uma terra onde corre leite e mel? Diga-me, porque me torturas e me crucificas?" E agora o que sinto (desculpem, se quiser parar de ler aqui, pare...) Sinto algo parecido com essas cenas. O Mistério Pascal, mesmo para os que não creem, é uma realidade humana e concreta. Vejo multidões saindo às ruas – talvez aquelas que mais benefícios receberam, que conseguiram sair de uma situação difícil – clamar: crucifica-a! "Vamos sangrá-la!!" Vamos tirá-la do caminho! E eu me pergunto e tento colocar-me no lugar dela, aquela pessoinha tão frágil, que quando tão jovem arrisca-se a dar a vida para libertar o povo – que é presa, torturada, mas continua firme, corajosa. Ninguém pode acusá-la de nada. Coloco-me no lugar dela perguntando: povo meu! Que é que te fiz? Em que te contristei? Foi por causa dos milhões de mães do bolsa família que agora alimentam seus filhos? Ou por causa da 'minha casa, minha vida' onde posso agora viver decentemente? Ou por causa do 'luz para todos', que veio iluminar minha existência? Ou porque o desemprego agora chegou a um mínimo? Ou por causa dos inúmeros planos educacionais, que levam milhares de jovens a poder estudar? Qual foi o crime que cometi? Só porque agora não posso continuar a dar-te mais benefícios? É por algum desses motivos que quer me crucificar, "me sangrar"? Responda-me!

De novo peço perdão se estou ferindo algum sentimento! Mas o 'mistério pascal' acontece a todo momento, em toda circunstância! Eu o experimento hoje assim... Repito: depois de 50 anos acompanhando a difícil ascensão dos pequenos, dos excluídos, dos que menos podem, das mulheres sofridas das vilas, do povo sem saúde, educação, moradia...que começam a ter mais dignidade de seres humanos...eu vejo gente gritando: crucifica-a! "Vamos fazê-la desaparecer! Vamos destruí-la, eliminá-la!" E me desculpem de novo: mas quem está incentivando essa multidão? Pergunto: quais os escribas, fariseus, sumos sacerdotes, as elites atingidas pelo Jesus Nazareno que questionava seus privilégios...quais essas elites hoje? Estaria equivocado se as identificasse com a grande mídia a serviço das elites de hoje? Essas multidões seriam capazes de ir às ruas, se não fossem incentivadas por esses monopólios da mídia a serviço dos que vêm seus privilégios ameaçados?

Mas o mistério pascal não é só paixão: é também ressurreição. E aqui minha fé: assim como Ele ressuscitou, esse nosso querido povo vai ressuscitar! Vai ter o direito de ter uma vida digna, como o Jesus de Nazaré queria, e por isso passou por todas essas humilhações. É preciso a paixão, para que haja ressurreição. Ele ressuscitará, essa gente será gente, ressuscitará com todos os que com Ele se solidarizarem e se colocarem a serviço de seu projeto de Fraternidade, Justiça, Amor.

Semana Santa: o paradoxo da morte criadora de vida

2/abr/2015, 8h42min

Semana Santa: o paradoxo da morte criadora de vida (por Jacques Távora Alfonsin)

Entre as muitas interpretações versadas sobre o julgamento e o assassinato de Jesus Cristo na cruz, alguns fatos continuam merecendo debate, não exclusiva e necessariamente relacionados com a religião. Foi julgado e condenado por um representante de autoridade externa a dos judeus, não foi garantida ao condenado a defesa jurídica, os motivos para a condenação não derivaram exclusivamente de heresia, nem a compra da traição de Judas recebeu qualquer menção no decorrer do processo, se pode se chamar processo a investigação da prova e a motivação da pena aplicada ao condenado.

Chama bastante a atenção nesses fatos, como a história se repete ainda hoje, muitos séculos depois, demonstrando não se encontrar na lei e na sentença as garantias exclusivas de justiça, nem o Estado ser o único legitimado ao monopólio sancionatório do respeito devido às três.

Leis, doutrinas jurídicas, argumentos de autoridade inspirados em preconceitos culturais e ideológicos distantes e avessos à realidade sofrida de gente pobre, como pobre era Jesus Cristo, ainda se assemelham agora aos mesmos argumentos "justificativos" da pena a Ele imposta e até aos seus injustos efeitos.

Com muitos agravantes. Ao tempo de Jesus Cristo, as responsabilidades do poder econômico e do religioso pela opressão e pela repressão política impostas ao povo pobre, ainda podia, pelo menos,  ser perfeitamente identificada e individualizada como se vê, por exemplo, na duríssima censura por Ele dirigida a quem exercia esses poderes. O capítulo 23 do Evangelho de São Mateus dá uma ideia disso, quando Jesus denuncia mestres e fariseus, gente muito rica de então que explorava e oprime o povo. Discursando para uma multidão, aconselhava como era necessário estar prevenida contra isso:

"Não imitem as suas ações, pois eles não fazem o que ensinam.  Amarram fardos pesados e os põem nas costas dos outros, mas eles mesmos não os ajudam, nem ao menos com um dedo a carregar esses fardos" (…) "Ai de vocês mestres da lei e fariseus hipócritas! Pois vocês exploram as viúvas e roubam os seus bens e, para disfarçarem, fazem longas orações." (…) "Ai de vós mestres da lei e fariseus hipócritas! Pois vocês dão a Deus a décima parte até mesmo da hortelã, da erva-doce  e do cominho, , mas não obedecem aos mandamentos mais importantes da Lei, que são os de serem justos com os outros, o de serem bondosos e o de serem honestos. Mas são justamente essas coisas que vocês devem fazer, sem deixar de lado as outras. Guias cegos! Coam um  mosquito, mas engolem um camelo! "

Atualmente, os alvos dessas críticas tratam de garantir sua invisibilidade. Diante de acusações daquela gravidade, em tudo semelhantes e implicadas no que ainda acontece agora, contra muita gente pobre, sabem Jesus ter sido condenado e morto, não apenas porque seus acusadores o acusavam de  blasfemo.

Mesmo assim, ainda há quem reduza toda essa injustiça a um só motivo. Pretende ver na morte de Jesus Cristo apenas um preço a ser pago (!) pelos pecados das pessoas. Uma espécie de passe mágico para a salvação da humanidade, assegurando sua chegada no céu. Esse sermão de Jesus é uma clara advertência contrária a um  tipo de raciocínio desses. Demonstra estar a fé em vigilante e permanente conflito com a injustiça e não como totalmente alheia ao exercício do poder político. Um inferno opressor bem terreno exige dela enfrentamento, combate e vitória, como exigências próprias da verdade e da justiça, condições essenciais de amor e de paz.

Jon Sobrino, por sinal, em estudo sobre "A fé em Jesus Cristo" (Petrópolis:Vozes, 2001) divide os seres humanos de uma forma simples e clara, não menos suficiente para, quem sabe, ter-se uma idéia menos ingênua dos efeitos permanentemente renovados e reconceituados na história, criados pela significado da morte de Jesus Cristo. Em chave de leitura capaz de não escandalizar até quem não acredita em ressurreição diz Jon:

"Creio eu que nós seres humanos nos dividimos em dois grupos: aqueles que dão (e damos) a vida, é claro, e aqueles que não dão, certamente, a vida; e na minha opinião , conforme se esteja neste ou naquele grupo mencionado, se vêem as coisas de maneira diferente. Como se compreendem os direitos humanos, a democracia, a liberdade, instituições como o sistema bancário, o aparelho judiciário, as forças armadas… varia enormemente conforme se esteja neste ou naquele grupo. E isto, creio eu, vale também no essencial para a compreensão da religião, da Igreja, da fé, da oração, da esperança… Em suma, da vida e da morte."

Sendo de Jesus Cristo, igualmente, a afirmação de que viera para dar a vida e vida em abundância, como recorda São João em seu evangelho, pode-se deduzir da opinião de Sobrino estarem no grupo dos que dão a vida também os da não vítimas. Esse dá prova de uma "ressurreição" diária, amorosa, cuidadosa e perseverante, a cada libertação de vítimas, com quem convive e é solidário.

O grupo dos que não dão a vida é justamente o grupo criador de vítimas. Portanto, o grupo que as coloca na cruz e as assassina, como assassinou Jesus Cristo. Um grupo de morte e não de vida nem de ressurreição, estejam essas envoltas nos mistérios que estiverem.

Identificar tais grupos, hoje, desafia um discernimento crítico necessário da realidade, quase sempre mascarada por quem tem interesse em falsear a verdade, para impedir de ser o que ainda não é, mas tem o direito de ser.

Por força de uma economia globalizada, por exemplo, dirigida também de fora, escondida numa irresponsabilidade anônima como era a do império romano do tempo de Jesus, contando com a cumplicidade de poderosos grupos econômicos nacionais, prossegue com dinheiro suficiente para comprar muitos Judas, manipular muitos Pilatos e crucificar milhões de pobres em todo o mundo, sem possibilidade de defesa, como também aconteceu com Ele, naquilo que Milton Santos já identificara como pobreza produzida de forma consciente e injusta. A capacidade de sacrificar muita gente, matar a terra e a natureza não contam para esse tipo de holocausto.

Nesta semana santa, então, quando a fé move multidões a se ajoelhar diante da cruz, talvez seja mais importante do que se solidarizar com a dor do crucificado, seguir o seu exemplo fazendo o que ele realmente quis:  retirar da cruz quantas/os ainda estão nela presos, libertá-los de toda miséria, exclusão, ódio e injustiça, dessa forma celebrando com todas/os uma nova ressurreição de vida pela qual vale a pena, como valeu para Jesus Cristo, dar a Sua Vida.

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Jacques Távora Alfonsin é Procurador do Estado aposentado, Mestre em Direito pela Unisinos, advogado e assessor jurídico de movimentos populares.



1 de abr. de 2015

Sete lições que já deveríamos ter aprendido sobre o golpe de 1964 e sua ditadura


09/03/2014 - Copyleft 
Antonio Lassance

Sete lições que já deveríamos ter aprendido sobre o golpe de 1964 e sua ditadura

Há 50 anos, o Brasil foi capturado pela mais longa, cruel e tacanha ditadura de sua história. Meio século é tempo suficiente para aprendermos algo sobre isso.


Há 50 anos, o Brasil foi capturado pela mais longa, mais cruel e mais tacanha ditadura de sua história.

Meio século é mais que suficiente tanto para aprendermos quanto para esquecermos muitas coisas.

É preciso escolher de que lado estamos diante dessas duas opções.

1ª. LIÇÃO: AQUELA FOI A PIOR DE TODAS AS DITADURAS

No período republicano, o Brasil teve duas ditaduras propriamente ditas. Além da de 1964, a de 1937, imposta por Getúlio Vargas e por ele apelidada de "Estado Novo". 

A ditadura de Vargas durou oito anos (1937 a 1945). A ditadura que começou em 1964 durou 21 anos. 

Vargas e seu regime fizeram prender, torturar e desaparecer muita gente, mas não na escala do que ocorreu a partir de 1964.

Os torturadores do Estado Novo eram cruéis. Mas nada se compara em intensidade e em profissionalismo sádico ao que se vê nos relatos colhidos pelo projeto "Brasil, nunca mais" ou, mais recentemente, pela Comissão da Verdade.

Em qualquer aspecto, a ditadura de 1964 não tem paralelo.

 
2ª. lição: QUALIFICAR A DITADURA SÓ COMO "MILITAR" ESCAMOTEIA O PAPEL DOS CIVIS

Foram os militares que deram o golpe, que indicaram os presidentes, que comandaram o aparato repressivo e deram as ordens de caçar e exterminar grupos de esquerda.

Mas a ditadura não teria se instalado não fosse o apoio civil e também a ajuda externa do governo Kennedy.

O golpismo não tinha só tanques e fuzis. Tinha partidos direitosos; veículos de imprensa agressivos; empresários com ódio de sindicatos; fazendeiros armados contra Ligas Camponesas, religiosos anticomunistas. Todos tão ou mais golpistas que os militares.

Sem os civis, os militares não iriam longe. A ditadura foi tão civil quanto militar. Tinha seu partido da ordem; sua imprensa dócil e colaboradora; seus empresários prediletos; seus cardeais a perdoar pecados.

 
3ª. LIÇÃO: NÃO HOUVE REVOLUÇÃO, E SIM REAÇÃO, GOLPE E DITADURA

Ernesto Geisel (presidente de 1974 a 1979) disse a seu jornalista preferido e confidente, Elio Gaspari, em 1981:

"O que houve em 1964 não foi uma revolução. As revoluções fazem-se por uma ideia, em favor de uma doutrina. Nós simplesmente fizemos um movimento para derrubar João Goulart. Foi um movimento contra, e não por alguma coisa. Era contra a subversão, contra a corrupção. Em primeiro lugar, nem a subversão nem a corrupção acabam. Você pode reprimi-las, mas não as destruirá. Era algo destinado a corrigir, não a construir algo novo, e isso não é revolução".

Quase ninguém usa mais o eufemismo "revolução" para se referir à ditadura, à exceção de alguns remanescentes da velha guarda golpista, que provavelmente ainda dormem de botinas, e alguns  desavisados, como o presidenciável Aécio Neves, que recentemente cometeu a gafe de chamar a ditadura de "revolução" (foi durante o 57º Congresso Estadual de Municípios de São Paulo, em abril de 2013).

Questionado depois por um jornal, deu uma aula sobre o uso criterioso de conceitos: "Ditadura, revolução, como quiserem".

A ditadura foi uma reação ao governo do presidente João Goulart e à sua proposta de reformas de base: reforma agrária, política e fiscal.

4ª. LIÇÃO: A CORRUPÇÃO PROSPEROU MUITO NA DITADURA

Ditaduras são regimes corruptos por excelência. Corrupção acobertada pelo autoritarismo, pela ausência de mecanismos de controle, pela regra de que as autoridades podem tudo.

A ditadura foi pródiga em escândalos de corrupção, como o da Capemi, justo a Caixa de Pecúlio dos Militares. As grandes obras, ditas faraônicas, eram o paraíso do superfaturamento.

Também ficaram célebres o caso Lutfalla (envolvendo o ex-governador Paulo Maluf, aliás, ele próprio uma criação da ditadura) e o escândalo da Mandioca.

5ª. LIÇÃO: A DITADURA ACABOU, MAS AINDA TEM MUITO ENTULHO AUTORITÁRIO POR AÍ

O Brasil ainda tem uma polícia militar que segue regulamentos criados pela ditadura.

A Polícia Civil de S. Paulo, em outubro de 2013, enquadrou na Lei de Segurança Nacional (LSN) duas pessoas presas durante protestos.

A tortura ainda é uma realidade presente, basta lembrar o caso Amarildo.

Os corredores do Congresso ainda mostram um desfile de filhotes da ditadura - deputados e senadores que foram da velha Arena (Aliança Renovadora Nacional, que apoiava o regime).

6ª. LIÇÃO: BANALIZAR A DITADURA É ACENDER UMA VELA EM SUA HOMENAGEM

Há duas formas de se banalizar a ditadura. Uma é achar que ela não foi lá tão dura assim. A outra é chamar de ditadura a tudo o que se vê de errado pela frente.

O primeiro caso tem seu pior exemplo no uso do termo "ditabranda" no editorial da Folha de S. Paulo de 17 de fevereiro de 2009.

Para a Folha de S. Paulo, a última ditadura brasileira foi uma branda ("ditabranda"), se comparada à da Argentina e à chilena.

A ditadura brasileira de fato foi diferente da chilena e da argentina, mas nunca foi "branda", como defende o jornal acusado de ter emprestado carros à Operação Bandeirantes, que caçava militantes de grupos de esquerda para serem presos e torturados.

Como disse a cientista política Maria Victoria Benevides, que infâmia é essa de chamar de brando um regime que prendeu, torturou, estuprou e assassinou?

A outra maneira de se banalizar a ditadura e de lhe render homenagens é não reconhecer as diferenças entre aquele regime e a atual democracia. Para alguns, qualquer coisa agora parece ditadura.

A proposta de lei antiterrorismo foi considerada uma recaída ditatorial do regime dos "comissários petistas" e mais dura que a LSN de 1969. Só que, para ser mais dura que a LSN de 1969, a proposta que tramita no Congresso deveria prever a prisão perpétua e a pena de morte.

O diplomata brasileiro que contrabandeou o senador boliviano Roger Pinto Molina para o Brasil comparou as condições da embaixada do Brasil na Bolívia à do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), a casa de tortura da ditadura.

Para se parecer com o DOI-CODI, a Embaixada brasileira em La Paz deveria estar aparelhada com pau de arara, latões para afogamento, cadeira do dragão (tipo de cadeira elétrica), palmatória etc.

Banalizar a ditadura é como acender uma vela de aniversário em sua homenagem.


7ª. LIÇÃO: JÁ PASSOU DA HORA DE PARAR COM AS HOMENAGENS OFICIAIS DE COMEMORAÇÃO DO GOLPE

Por muitos e muitos anos, os comandantes militares fizeram discursos no dia 31 de março em comemoração (isso mesmo) à "Revolução" de 1964.

A provocação oficial, em plena democracia, levou um cala-a-boca em 2011, primeiro ano da presidência Dilma. Neste mesmo ano também foi instituída a Comissão da Verdade.

A referência ao 31 de março foi inventada para evitar que a data de comemoração do golpe fosse o 1º. de abril – Dia da Mentira.

A justificativa é que, no dia 31, o general Olympio Mourão Filho, comandante da 4ª Região Militar, em Minas Gerais, começou a movimentar suas tropas em direção ao Rio de Janeiro.

Se é assim, a Independência do Brasil doravante deve ser comemorada no dia 14 de agosto, que foi a data em que o príncipe D. Pedro montou em seu cavalo para se deslocar do Rio de Janeiro para as margens do Ipiranga, no estado de São Paulo.

A palavra golpe tem esse nome por indicar a deposição de um governante do poder. No dia 1º. de abril, João Goulart, que estava no Rio de Janeiro, chegou a retornar para Brasília. Em seguida, foi para o Rio Grande do Sul e, depois, exilou-se no Uruguai  mas só em 4/4/1964. Que presidente é deposto e viaja para a capital um dia depois do golpe?

O Almanaque da Folha é um dos tantos que insistem na desinformação:
"31.mar.64 — O presidente da República, João Goulart, é deposto pelo golpe militar". Entende-se. Afinal, trata-se do pessoal da ditabranda.

O que continua incompreensível é o livro "Os presidentes e a República", editado pelo Arquivo Nacional, sob a chancela do Ministério da Justiça, trazer ainda a seguinte frase:

"Em 31 de março de 1964, o comandante da 4ª Região Militar, sediada em Juiz de Fora, Minas Gerais, iniciou a movimentação de tropas em direção ao Rio de Janeiro. A despeito de algumas tentativas de resistência, o presidente Goulart reconheceu a impossibilidade de oposição ao movimento militar que o destituiu".

De novo, o conto da Carochinha do 31 de março.

Ainda mais incompreensível é o livro colocar as juntas militares de 1930 e de 1969 na lista dos presidentes da República.

A lista (errada) é reproduzida na própria página da Presidência da República como informação sobre os presidentes do Brasil.

Nem os membros das juntas esperavam tanto. A junta governativa de 1930 assinava seus atos riscando a expressão "Presidente da República".  

No caso da junta de 1969, o livro do Arquivo Nacional diz (p. 145) que o Ato Institucional nº. 12 (AI-12) "dava posse à junta militar" composta pelos ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. Ledo engano.

O AI-12, textualmente: "Confere aos Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar as funções exercidas pelo Presidente da República, Marechal Arthur da Costa e Silva, enquanto durar sua enfermidade". Oficialmente, o presidente continuava sendo Costa e Silva.

Há outro problema. Uma lei da física, o famoso princípio da impenetrabilidade da matéria, diz que diz que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo – que dirá três corpos. 

Não há como três chefes militares ocuparem o mesmo cargo de presidente da República. Que república no mundo tem três presidentes ao mesmo tempo?

O que os membros da Junta de 1969 fizeram foi exercer as funções do presidente, ou seja, tomar o controle do governo. O AI-14/1969 declarou o cargo oficialmente vago, quando a enfermidade de Costa e Silva mostrou-se irreversível. 

Os três comandantes militares jamais imaginaram que um dia seriam listados em um capítulo à parte no panteão dos presidentes. A Junta ficaria certamente satisfeita com a homenagem honrosa e, definitivamente, imerecida.

Que história, afinal, estamos contando?

Uma história que ainda não faz sentido.

Uma história cujas lições ainda nos resta aprender.


(*) Antonio Lassance é cientista político.




Em cada diferença, a igualdade

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